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Extrema Direita, Extrema Esquerda e a Curva de Gauss

Oswaldir Ehlke Scholz

Sim, o título desta coluna já capturou a sua atenção, hein, caro leitor? Nestes tempos bicudos, de muito mi-mi-mi, do “politicamente correto”, do noticiário tóxico de mandos e desmandos da política e de políticos (com ‘p’ minúsculo, infelizmente), da polarização exacerbada do “nós contra eles”, parece que estamos com os nervos à flor da pele. Façamos, pois – com calma e tranquilidade -, algumas considerações sobre a temática proposta.

Como ponto de partida, peço que a sua imaginação visualize uma simples linha. Com 10 cm de largura, já está de bom tamanho. Essa linha tem duas extremidades, a extrema esquerda e a extrema direita (ops!). Supondo-se que a ponta extrema do lado esquerdo esteja pintada de um vermelho bem forte, enquanto a ponta oposta recebeu um azul intenso, o que ocorre quando, de cada extremidade, nos dirigimos para o centro da representação? Como a linha é uma só, um “continuum”, as cores vão diminuindo de intensidade à medida que se aproximam do ponto central. Preparei, a título de exemplo, uma linha bem mais grossa do que a sua visão inicial para destacar essa variabilidade:

Nessa linha de raciocínio é interessante recordar a origem dos termos “direita” e “esquerda”, aplicados ao espectro político. Em meu tempo de piá, na Lapa, eu poderia recorrer a um volume da Barsa. Nesta altura do campeonato, o Google está aí mesmo para esclarecer ou tirar dúvidas. Pois bem:

“Os termos ‘direita’ e ‘esquerda’ na política têm sua origem na Revolução Francesa, de 1789. Durante as sessões da Assembleia Nacional Constituinte, os membros se organizaram fisicamente de acordo com suas opiniões políticas: aqueles que apoiavam o rei e a ordem estabelecida sentavam-se à direita do presidente da Assembleia, enquanto os que defendiam mudanças radicais e uma nova ordem, sentavam-se à esquerda.”

(https://brasilescola.uol.com.br/politica/direita-esquerda.htm)

Com o tempo, essa disposição espacial foi adotada como uma metáfora para descrever as orientações políticas em geral. A direita passou a representar aqueles que defendem a manutenção do status quo, a preservação das tradições e a ordem social existente; enquanto a esquerda passou a ser associada aos que buscam mudanças sociais, econômicas e políticas, frequentemente em direção à maior igualdade e justiça social

PALAVRA DE CIENTISTAS SOCIAIS

A diferença entre “direita” e “esquerda” pode ser mais bem assimilada com o recurso da voz de renomados estudiosos. De forma sintética, vejamos a distinção crítica:

  • NORBERTO BOBBIO – Filósofo e teórico político italiano. Defende a ideia de que a diferença resulta da atitude em relação à ideia de igualdade social. Assim, a redução de disparidades sociais e econômicas é o mote da esquerda, enquanto a direita procura preservar as hierarquias sociais e a liberdade individual.
  • RAYMOND ARON – Sociólogo e filósofo político francês. Ressalta, como fator diferenciador, a atitude em relação à mudança e ao progresso. Considera a justiça social como luta da esquerda, e a manutenção da ordem e estabilidade como bandeira da direita.
  • GIOVANNI SARTORI – Cientista político italiano. Prioridades valorizativas são o fiel da comparação. Igualdade acima de tudo é o jargão da esquerda, enquanto a direita prega liberdade e a ordem.
  • MAURICE DUVENGER – Cientista político francês. Defende a perspectiva histórica como chave de diferenciação. Para a esquerda prevalece o progressismo, a luta por mudanças sociais e a defesa dos oprimidos. A direita, por seu turno, defende o conservadorismo, a defesa da ordem estabelecida e das tradições.
  • ERIK VON KUEHNELT – Filósofo e historiador político austríaco. Enquanto a esquerda é ideológica e utópica, considera que o traço da direita é o pragmatismo e o realismo.

Em síntese, a esquerda promove a igualdade social e econômica, a intervenção estatal para garantir direitos e proteção social, e uma visão progressista que inclui o apoio a minorias e a cooperação internacional.

A direita, em síntese, defende a manutenção das hierarquias sociais, a liberdade econômica e a preservação das tradições, enfatizando a ordem, a estabilidade e o nacionalismo como pilares fundamentais.

Os valores políticos e o papel do Estado que são defendidos por direita e esquerda têm, portanto, bases filosóficas distintas e advêm de visões diferentes de mundo e da natureza humana. Essas visões promovem relações sociais diferentes e indivíduos com virtudes específicas. A esquerda, em geral, tem um caráter essencialmente coletivista, enquanto a direita é essencialmente individualista.

E A CURVA DE GAUSS, ONDE ENTRA NESTA HISTÓRIA?

A curva de Gauss foi idealizada em 1809 pelo matemático alemão Carl Friedrich Gauss (1777-1855). Inicialmente, utilizou a curva para analisar dados astronômicos. Posteriormente, passou a ser utilizada para a descrição de outros fenômenos naturais. Também conhecida como ‘distribuição normal’, é uma ferramenta muito utilizada na estatística e na interpretação de estudos científicos.

Uma das aplicações da curva de Gauss é descrever a distribuição numérica de uma população, permitindo resumir e compreender a tendência central e a dispersão de um conjunto de dados. A curva de Gauss é simétrica em torno do seu ponto médio, apresentando o famoso formato de sino. O ponto mais alto da representação gráfica (o “cume” do sino) significa que, estatisticamente, reúne a maior quantidade de elementos, isto é, a maior frequência. Em compensação, podemos assumir que, tanto na parte esquerda do sino, quanto na parte direita, a frequência de indivíduos é menor.

Retomemos, agora, ao pedido de visualização de uma linha de 10 cm que você ajudou a conceber. Eu a representei como um “continuum” que partiu da “extrema esquerda” para o centro da linha, enquanto a extremidade oposta – a “extrema direita” – fazia o caminho inverso. Compreende-se agora que, nessa movimentação, a diminuição da tonalidade da cor simboliza um menor número ou intensidade de indivíduos. Os pontos extremos, vermelho e azul, correspondem à base da representação da curva, enquanto o branco representado na parte mais alta do sino tem uma frequência maior.

Pata fechar o raciocínio: a maior parte de indivíduos de “extrema esquerda” e de “extrema direita” estão localizados na borda da representação gráfica. A grande quantidade, a maioria relativa de indivíduos, circunscreve-se na área central: não são esquerdistas assumidos, tampouco direitistas. Tomando como referência um dos princípios da Teoria de Sistemas, essa grande maioria “equilibra-se” numa posição de homeostasia dinâmica. Enquanto a homeostasia tem a ver com sinais de equilíbrio e estabilidade, a dinâmica pressupõe alteração e mudança. Homeostase dinâmica é, pois, uma estratégia para enfrentar o processo entrópico, ou seja, a tendência do sistema social à deterioração e esgarçamento de valores e padrões significativos.

Redação JBA Notícias

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