Saúde

Jovens adiam ter filhos e buscam no congelamento de gametas uma alternativa para o futuro

*Marcos Sampaio

Diante dos desafios profissionais cada vez mais instigantes, as possibilidades de viajar mundo afora e trabalhar em home office, a saída tardia da casa dos pais, a pandemia que retirou as pessoas do seu círculo social por quase três anos. São muitas as razões na atualidade para que jovens – homens e mulheres – adiem cada vez mais a decisão de ter filhos. E existe uma outra situação ocorrendo no mundo: há pessoas que não querem ter filhos. Uma pesquisa global da farmacêutica Bayer, com apoio da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) e do Think about Needs in Contraception (Tanco), indicou que o índice de pessoas que afirmam não querer ter filhos chega a 72%; no Brasil, 37% das mulheres ouvidas disseram não querer ser mães.

Na prática clínica, no entanto, assistimos a outra realidade: um cenário de muitas certezas e incertezas perante o início da vida adulta, e muitos casais já mais velhos querendo ter filhos. Nesse cenário, tem crescido a procura pelo processo de congelamento de óvulos e espermatozoides. Na clínica Origen BH, os procedimentos tiveram aumento entre 25% e 30% desde 2018 sendo que no ano 2022 esta demanda apresentou-se superior. E acredito que essa seja uma tendência global.

Porque homens e mulheres mais jovens, além de estarem em busca de vivenciar experiências de vida e navegar pelas oportunidades profissionais antes de ter filhos, ainda querem ter a certeza de que o(a) parceiro(a) escolhido(a) para ter filhos terá condições de compartilhar a jornada da educação, do dia a dia. Com isso, o tempo vai passando e o congelamento de óvulos e espermatozoides se torna uma alternativa interessante para mantê-los criopreservados de forma saudável.

O congelamento de óvulos e espermatozoides foi criado nos idos de 1980, mas ganhou notoriedade na transição dos séculos 20 e 21, quando um bebê britânico foi gerado graças ao congelamento do óvulo de sua mãe, realizado seis meses antes da fertilização. Essa experiência abriu novas possibilidades para esse adiamento da decisão de ter filhos. Importante lembrar que diferentemente do homem, que mantém uma carga de espermatozoides aptos à fecundação por mais tempo, a mulher nasce com seu ‘estoque’ de óvulos já predeterminado e, ao longo da vida, pode apresentar doenças nos ovários, como a menopausa precoce, a Síndrome dos Ovários Policísticos ou a Endometriose, que podem trazer maior dificuldade na capacidade de engravidar.

Com os avanços da medicina reprodutiva, hoje as técnicas de congelamento estão bem mais eficazes e consegue-se taxas de gravidez elevadas, até 30%, com a criopreservação dos óvulos. A técnica mais empregada atualmente e que apresenta a maior taxa de sucesso é conhecida como vitrificação (congelamento ultrarrápido). Após o congelamento de espermatozoides e óvulos, homem e mulher poderão decidir quando gostariam de descongelá-los para uma futura fertilização in vitro. Assim, mesmo ao envelhecer, ambos terão seus materiais preservados, com a ‘idade’ em que foram congelados.

Muitos pacientes quando vão a clínicas de reprodução assistida buscam informações sobre qual a idade ideal para o congelamento de óvulos e espermatozoides. A resposta é: quanto mais jovem, melhor. Os espermatozoides também ‘envelhecem’ e merecem cuidado. Então, sempre digo que o ideal para o congelamento de gametas é até os 35 anos. A partir dessa idade, o congelamento pode ser feito, mas as taxas de gravidez começam a diminuir para as mulheres, e a qualidade dos seus óvulos também.

Na minha visão como médico e especialista da reprodução humana, jovens devem pensar sobre seus anseios e sonhos e, caso tenham alguma vontade de ter filhos no futuro, procurar seus médicos de rotina para uma orientação e, depois, uma clínica de reprodução assistida, para entenderem um pouco mais sobre esse universo e as possibilidades que a medicina reprodutiva oferece hoje. Vivemos uma vida fugaz, na atualidade, com a sensação de que é tudo aqui e agora, mas, no caso do tempo biológico, principalmente das mulheres, os óvulos têm tempo de vida e esse tempo passa muito rápido, afinal, nossa ampulheta vira a cada dia.

*Marcos Sampaio é médico ginecologista, especialista em reprodução assistida e diretor da clínica Origen BH

Redação JBA Notícias

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