Vereadores pedem tempo para mediar situação da Ocupação Tiradentes 2
Vizinha do aterro da Solví Essencis, no CIC, a Tiradentes 2 é formada por 64 famílias que podem ser despejadas devido à reintegração de posse pedida pela empresa.
A empresa Solví Essencis e lideranças comunitárias da Ocupação Tiradentes 2 conversaram, separadamente, com vereadores da Câmara Municipal de Curitiba (CMC), nessa quarta-feira (5), sobre o conflito fundiário que se estabeleceu em abril de 2021 às margens do aterro sanitário, no bairro CIC. Agora, o conflito evoluiu para um pedido de reintegração de posse que, quando executado, irá despejar 64 famílias. A mediação da CMC foi solicitada pelo Movimento Popular por Moradia (MPM).
Em diligência à área do conflito fundiário, os vereadores Giorgia Prates – Mandata Preta (PT), que é presidente da Comissão de Direitos Humanos, Mauro Bobato (Pode), presidente da Comissão de Urbanismo, Professora Josete (PT), presidente da Frente Parlamentar de Segurança Alimentar, e Pastor Marciano Alves (Solidariedade), membro da Comissão de Saúde, foram recebidos por representantes da Essencis em uma reunião que durou cerca de uma hora e meia.
Os vereadores relataram que o superintendente da Solví Essencis no Paraná, João Paulo Mota, argumentou que a Ocupação Tiradentes 2 está em uma área de risco, que a empresa precisa manter para garantir padrões de segurança para sua operação. É o mesmo argumento da reintegração de posse, em que a Solví Essencis fala que a permanência da comunidade “interferiria na segurança de seus funcionários, na saúde e segurança dos próprios ocupantes e levaria ao desmatamento da vegetação local”.
O conflito fundiário na região vem desde 2015, quando a Ocupação Tiradentes 1 se instalou em uma área da antiga empresa Stirps, cuja administração da massa falida tinha locado para a Solví Essencis. Na ocasião, a empresa também obteve na Justiça Estadual a reintegração da área, mas, por questões sociais, o despejo não foi executado, em razão de haver 800 famílias ali. Na época, a comunidade respeitou o limite da área de preservação no entorno do aterro sanitário, mas isso mudou em abril de 2021, durante a pandemia de covid-19.
O superintendente da Solví Essencis relatou que o avanço para a área antes respeitada pela Tiradentes começou com 30 casas e que hoje seriam quase 80. Aos vereadores, o Movimento Popular por Moradia fala em 64 famílias e cobra ação do Poder Público para buscar o realojamento das pessoas se for haver o cumprimento da reintegração de posse. Participaram da diligência os mandatos dos vereadores Angelo Vanhoni (PT) e Herivelto Oliveira (Cidadania), sendo que entraram na reunião representantes da deputada federal Carol Dartora (PT) e do deputado estadual Renato Freitas (PT).
“Buscar alternativas”
“As famílias precisam de moradia e não podem ser retiradas dali de maneira brutal, sem nenhum planejamento, sem a realocação adequada. O que viemos fazer aqui, ouvindo a empresa, é buscar diálogo para que não haja violência. Estamos buscando não violentar os direitos das pessoas, nem os direitos da empresa. Queremos trazer a Prefeitura de Curitiba para o debate e estabelecer esse acordo”, resumiu Giorgia Prates. “Enquanto não houver a reintegração podemos buscar alternativas, o ideal seria pará-la para que a gente possa dialogar”, desejou.
“É uma situação de difícil solução”, concordou Mauro Bobato, “que passa essencialmente por encontrar um lugar para as 64 famílias da Tiradentes 2”. “Foi importante vir aqui e ouvir os motivos da empresa [para o pedido de reintegração de posse]”, expôs Marciano Alves, que apontou a aparente “falta de interesse do Município com o problema”. “A gente entende que não é um lugar adequado para moradia, mas as pessoas não têm alternativa, então é o Poder Público que tem que buscar solução”, completou a Professora Josete.
O envolvimento do Poder Público é também a reivindicação do Movimento Popular por Moradia (MPM), que foi representado na atividade por Sylvia Malatesta e Fernando Marcelino. “Queremos abrir a negociação, para que a moradia não vire despejo”, resumiu a advogada do MPM. Sylvia Malatesta explicou que, no entendimento do movimento social, há pontos controversos na decisão judicial favorável à reintegração de posse, como a ausência da Defensoria Pública nos atos iniciais do processo.
Durante a diligência à comunidade Tiradentes 2, acompanhando a vereadora Giorgia Prates, que foi levar o resultado da reunião aos moradores da ocupação, a reportagem conversou com um casal de moradores que está ali desde abril de 2021, quando as primeiras casas foram montadas. Maria Aparecida Pinto, 69 anos de idade, mora com seu companheiro, Miguel Pinheiro, 60. Ele era operador de máquinas, mas foi afastado do serviço com lesões na coluna vertebral e, desde então, aguarda a avaliação do INNS sobre seu caso. Ela é aposentada.
“Não existe segundo plano, a gente só tem esse lugar aqui. Se sair daqui, não sei para onde vamos”, disse Miguel Pinheiro. “O lixão emite um cheiro estranho à noite, deve fazer mal, mas nós gostaríamos muito de ficar aqui mesmo. Se houver um lugar para levar cada um que está aqui, adequado e definitivo, não há motivo para não sair [daqui], senão a gente fica aqui mesmo. Nós vamos resistir”, completou. “Não é justo tirar a gente daqui. Pra quê? Pôr mais lixo?”, questionou Maria Aparecida.
Sobre a insalubridade da área, o casal questiona que, também muito próximo ao aterro, há um colégio, uma casa de custódia e uma estação da Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar). Maria e Miguel moravam em Colombo, mas ele perdeu o emprego durante a pandemia de covid-19 e, somente com a aposentadoria dela, eles não conseguiram pagar o aluguel de onde moravam. Ameaçados pelo despejo, vieram para a Tiradentes 2.
O MPM disse aos vereadores de Curitiba que, quando há despejos sem planejar a realocação das famílias, ou essas pessoas terão que ocupar uma nova área ou serão incorporadas em outras comunidades, permanecendo na condição precária de moradia. Em audiência pública recente sobre regularização fundiária na cidade, falou-se em 453 ocupações irregulares dentro do município, sem abranger as localizadas na região metropolitana. A atividade da CMC foi parcialmente acompanhada por Cícero Donizete Ignácio, articulador da Cohab-CT.
*Notícia revisada pelo estudante de Letras Brunno Abati
Supervisão do estágio: Alex Gruba